Flexibilização da Prisão diante o Coronavírus (COVID-19)

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Introdução

No atual contexto de pandemia mundial por conta dos diversos casos de contaminação pelo novo coronavírus (COVID-19), muitas situações estão exigindo medidas excepcionalíssimas do Poder Público.

Nesse mesmo cenário, o Poder Judiciário e Penitenciário tem tido vários desafios para adequar o sistema, em especial o sistema criminal brasileiro, às necessidades relacionadas à saúde pública da população carcerária.

Por um lado muitos defendem que a situação não justifica uma flexibilização de penas, mesmo para quem integre os chamados grupos de risco.

Antagonicamente, muitos defendem que a flexibilização das prisões (sejam prisões cautelares ou prisão pena) é uma medida paliativa a ser tomada, não somente para proteger o preso em si, mas a própria coletividade.

O presente texto deste blog jurídico do escritório Romagnolo & Zampieri Advogados Associados visa informar acerca da flexibilização das prisões diante à pandemia do novo coronavírus (COVID-19) no âmbito dos tribunais superiores, sobretudo no STJ – Superior Tribunal de Justiça.

Posicionamento do STJ – Superior Tribunal de Justiça

O STJ – Supremo Tribunal de Justiça já tem se deparado com os primeiros casos em análise de recursos, onde o tribunal é provocado a se manifestar sobre o assunto, e esse breve artigo informativo visa exatamente apresentar aos leitores, de forma resumida, como tem sido os primeiros precedentes naquele tribunal, acerca do assunto.

Incialmente, no caso prático utilizado como embasamento (RCD no HABEAS CORPUS Nº 563.142 – SE (2020/0044621-5) temos basicamente um pedido da defesa, em fevereiro deste ano de 2020, que era no sentido de que haveria em tese o constrangimento ilegal na prisão preventiva, pois a saúde do preso era muito frágil, devido a problemas respiratórios, necessitando inclusive de uso contínuo de um CPAP – aparelho que evita o bloqueio da respiração.

Diante disso, a defesa solicitou então a revogação da prisão preventiva ou o deferimento de prisão domiciliar, até o fim do julgamento do habeas corpus.

Preliminarmente, o STJ indeferiu a liminar, sob o entendimento de que não haveria qualquer ilegalidade na prisão preventiva, posto que o equipamento que auxilia a respiração do preso já havia sido entregue na enfermaria da instituição prisional.

No entanto, alegando que o empresário piorou, além de estar no grupo de risco da Covid-19 (pois é cardiopata, diabético e tem problema respiratório agudo), a defesa pediu reconsideração e em recurso, o STJ, em sede de recurso, concedeu o pedido.

Consequentemente, o STJ, sob esse novo prisma apresentado pela defesa, e já no atual contexto de paralisações de atividades pelo país e recomendações das autoridades, considerou que o preso comprovou de fato ser portador de comorbidades que necessitam de acompanhamento constante (diabetes, hipertensão, distúrbio severo do sono com necessidade de utilização de CPAP).

Os ministros daquele Tribunal Superior consideraram também o relatório médico juntado nos autos que revela que o quadro clínico do preso foi agravado, se tratando de pessoa com 51 anos, obeso, hipertenso e diabético, com diagnóstico de infecções urinária e outras infecções, e a evidente necessidade de transferência para unidade de urgência, ante a suspeita de “pielonefrite”.

Declaração de Pandemia pela OMS – Organização Mundial de Saúde

Um outro fundamento para a decisão do STJ foi a declaração pública da situação de pandemia pelo novo coronavírus (Covid-19), no dia 30 de janeiro de 2020, pela OMS – Organização Mundial de Saúde, que requer a adoção de medidas preventivas de saúde pública para evitar a propagação do vírus.

Enquadramento na Recomendação n. 62 do CNJ – Conselho Nacional de Justiça

O ministro relator também considerou o fato de o paciente se encontrar dentro do grupo de risco, nos termos da Recomendação n. 62 do CNJ, de 17 de março de 2020, a qual estabelece medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus (Covid-19) no âmbito dos sistemas de justiça penal e socioeducativo; o que impõe, no caso concreto, a necessidade de reanálise da prisão.

Dessa forma, como já antecipado, o STJ reputou legítima a substituição da prisão preventiva do paciente pela prisão domiciliar, sem prejuízo de que sejam eventualmente fixadas outras medidas cautelares constantes no art. 319 do CPP, a critério do juízo criminal local.

Considerações

Como é evidente, pela decisão recente do STJ, há uma tendência, em casos específicos, de os tribunais acolherem o entendimento emanado pelo Tribunal Superior, no RCD em HC 563.142 – SE, e aos poucos flexibilizar a prisão de pessoas que se encontrem em grupos de risco, como já recomendado pelo CNJ.

Essa é uma medida paliativa, que certamente será acatada pelos magistrados de todo o país.

Atenção: Proteção da Saúde pública

No entanto, é preciso estar bem atento a alguns fatos.

Primeiro, deve-se ter em mente que a flexibilização da prisão não será banalizada de forma alguma, sendo cabível somente em casos que se encaixem nos parâmetros de proteção da saúde pública.

Segundo, que é necessário comprovar, cabalmente, que o preso se enquadra nesse quadro, não bastando a mera alegação, infundada. Esse tipo de pedido, por parte dos advogados, tende a criar falsas expectativas nos presos, além de congestionar o Poder Judiciário com pedidos fadados ao fracasso.

Terceira consideração é que esse precedente não é vinculante, por óbvio, então os julgadores de primeira ou segunda instância não estão atrelados a essa lógica, podendo aplicar o direito de acordo com sua livre persuasão racional.

Política Criminal e Saúde Pública

Por derradeiro, há que se mencionar acerca dessa situação de flexibilização em certos casos de prisão, que não é de modo algum uma regalia ao preso, mas uma medida de proteção coletiva, isto é, uma política criminal de resguarde da saúde pública, ao passo que a contaminação generalizada de qualquer vírus no sistema penitenciário brasileiro é muito provável, até pelas condições extremamente precárias de infraestrutura e a própria superlotação.

Lembrando que esse tipo de contaminação, certamente não ficaria exclusivamente dentro dos presídios, mas em questão de um curto intervalo de tempo se alastraria para fora dos presídios, frustrando todas as demais medidas preventivas tomadas pelo Poder Público em relação ao COVID-19 (coronavírus).

Conclusão

Eis um breve texto acerca do posicionamento do STJ e CNJ no que tange à medidas preventivas para o combate ao novo coronavírus (COVID-19) no âmbito dos estabelecimentos penais.

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