Cláusula Arbitral e Pedido de Falência

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Em julgado recente, o Superior Tribunal de Justiça teceu o entendimento que mesmo havendo a estipulação de uma cláusula arbitral em um contrato não impede que o credor peça a falência do devedor por falta de pagamento.

A decisão impõe que o pedido de falência previsto no artigo 94, I, da Lei 11.101/05, não é afetado pela cláusula arbitral que, em teoria, teria o condão de obstar o interesse de agir no judiciário. Fundamenta-se tal decisão pelo fato de que a arbitragem não tem poderes de natureza executiva.

O caso analisado pelo Tribunal Superior versa sobre uma dívida entre um fornecedor e a Volkswagen do Brasil. A fornecedora alega ser credora de R$ 617 mil, estampados em duplicatas protestadas.

O juiz de primeiro grau entendeu inexistir interesse de agir da ação, diante da ausência de a demanda ter sido levada à um juízo arbitral anteriormente. A sentença extinguiu o processo, sem resolução do mérito da questão.

Em apelação, o Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu pela reforma da sentença, determinando a devolução dos autos ao primeiro grau, visando oportunizar a análise do pedido de falência pelo juízo à quo.

A montadora recorreu ao STJ. O relator, ministro Raul Araújo, afirmou a pactuação de cláusula compromissória não macula a executividade do título de crédito, e também não tem o condão de impedir a deflagração do procedimento falimentar previsto na legislação:

“No caso concreto, a despeito da previsão contratual de cláusula compromissória, existem títulos executivos inadimplidos, consistentes em duplicatas protestadas e acompanhadas de documentos para comprovar a prestação efetiva dos serviços, o que dá ensejo à execução forçada ou ao pedido de falência, com fundamento no artigo 94, I, da Lei 11.101/05, que ostenta natureza de execução coletiva”.

Ainda de acordo com o relator, diante do fato de que a questão gira em torno de um título de crédito com força executiva, o credor é obrigado a recorrer ao judiciário para buscar seu direito, pelo fato de que o juízo arbitral não tem força executiva, ainda mais levando-se em conta que os atos de penhora só podem ser efetivados no judiciário.

Veja a ementa:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. PEDIDO DE FALÊNCIA. INADIMPLEMENTO DE TÍTULOS DE CRÉDITO. CONTRATO COM CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA. INSTAURAÇÃO PRÉVIA DO JUÍZO ARBITRAL. DESNECESSIDADE. DEPÓSITO ELISIVO. EXTINÇÃO DO FEITO. DESCABIMENTO. 1. Não se verifica a alegada violação ao art. 1.022 do CPC/2015, na medida em que a eg. Corte de origem dirimiu, fundamentadamente, a questão que lhe foi submetida, não sendo possível confundir julgamento desfavorável com negativa de prestação jurisdicional ou ausência de fundamentação. 2. A pactuação de convenção de arbitragem possui força vinculante, mas não afasta, em definitivo, a jurisdição estatal, pois é perfeitamente admissível a convivência harmônica das duas jurisdições, desde que respeitadas as competências correspondentes. 3. A existência de cláusula compromissória não afeta a executividade do título de crédito inadimplido e não impede a deflagração do procedimento falimentar, fundamentado no art. 94, I, da Lei 11.101/2005. Logo, é de se reconhecer o direito do credor que só pode ser exercitado mediante provocação estatal, já que o árbitro não possui poderes de natureza executiva. 4. O depósito elisivo da falência, nos moldes do art. 98, parágrafo único, da Lei 11.101/2005, não é fato que autoriza o fim do processo de falência, uma vez que, a partir de então, o processo se converte em ação de cobrança e segue pela via executiva comum, o que seria inviável no juízo arbitral. 5. O processo deve, portanto, prosseguir perante a jurisdição estatal, porque, aparelhado o pedido de falência em impontualidade injustificada de títulos que superam o piso previsto na lei (art. 94, I, da Lei 11.101/2005), por absoluta presunção legal, fica afastada a alegação de atalhamento do processo de execução/cobrança pela via falimentar. 6. Recurso especial a que se nega provimento. (RECURSO ESPECIAL Nº 1.733.685 – SP (2018/0076990-4) RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO, julgado em  06 de novembro de 2018).

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